segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Teatro Musical – Saindo do Quadrado!


           Uma visão a partir de V. Meyerhold

Nas ultimas décadas o Teatro Musical recuperou sua força artística e popularidade. No ocidente, isso foi reforçado com a produção de musicais com temáticas que interessam aos jovens nos grandes circuitos de Nova York. No entanto, não é ali que nasce o teatro musical. Nem deve ser apenas este considerado como tal. Seria uma visão extremamente limitadora e colonialista.
Há muitos teatros musicais, o que nos abre inúmeras possibilidades em relação a ele. Principalmente levando-se em conta o grande desenvolvimento e interesse de atores e público por ele no Brasil, nesses últimos anos. Certamente, há um caminho originado na ópera. Mas se estudarmos o oriente, veremos que teatro e musica são coexistentes e inseparáveis. Há ainda um teatro musical originado no Circo.
Dada essa variedade, e por não achar coerente limitar a visão artística sobre o Teatro Musical, quero dividir com vocês um pouco dos estudos sobre Meyerhold sobre o tema. Discípulo de Stanislaviski, Meyerhold se tornou um grande mestre do teatro que, por motivos históricos que não vou tratar aqui, acabou proibido de ser estudado por muitos anos. Mas já desde 1912, quando coordenava os programas de Teatro, Dança, Música e Circo da Rússia, buscava a formação de artistas em Teatro Musical.
Não no mesmo sentido da Gesamtkunstwerk[1] realizadas por Richard Wagner e que tiveram uma influência essencial nos caminhos percorridos pelo teatro europeu, nem somente nos modelos orientais, que situam a orquestra no palco.  Mesmo bebendo dessas fontes, o Teatro Musical de Meyerhold aprofunda certas questões, abrangendo sempre os papeis a serem desempenhados por todos os envolvidos na criação cênica e a função crítica da arte.
De forma ampla, essa expressão é utilizada para designar todo gênero artístico que mistura elementos teatrais e musicais, não importando a proporção de sua utilização. Desde que integradas música, texto e elementos visuais.
Em outra percepção, designa um teatro onde não é possível separar claramente as funções de ator, das de músico e das de dançarino, pois o intérprete deve ser capaz de friccionar essas artes em seu corpo. Esse é um teatro que utiliza a música para fins dramáticos, no qual os componentes musicais e teatrais se equivalem.
Há, ainda, comercialmente uma ideia de que o Teatro Musical é um gênero importado da Broadway, em forma de franquia, onde o foco é o entretenimento do público e nesse espetáculo se apresentam, num mesmo palco, atores, bailarinos e cantores, que por vezes revezam-se nesses papéis, sem no entanto precisarem passar por um processo de incorporação deles, mas mostrando seu virtuosismo em apenas uma dessas linguagens, ficando a “função” de ator subordinada às outras duas.
Nenhuma dessas definições, no entanto, “corresponde à noção de teatro musical que se depreende da prática de Meyerhod, na qual as relações entre teatro e música não são de equivalência, mas extremamente complexas e variáveis. Em sua obra, o “teatro musical” seria uma forma de teatro dialogado em que o papel da música, audível e inaudível, é o de valorizar o texto, estruturá-lo, aprofundar seu sentido, encená-lo afinal. Seria um teatro dramático, no qual a música tem um papel essencial na encenação de um texto.”[2]A música não ilustra ou reforça as ações, ele é a sua base, sua estrutura, uma vez que, com o corpo, o ator a realiza para executar as ações que lhe foram designadas. Tudo é musicalizado: o texto, o gesto, o olhar, a iluminação.
Num espetáculo meyerholdiano, a música se combina a partir de duas fontes principais: o diretor e o texto. Essa estrutura leva Meyerhold a elaborar, a partir de 1930, o princípio do Realismo Musical. Esse movimento em seu fazer teatral significa um amadurecimento pós reação ao naturalismo e a toda sua experimentação simbolista. No realismo musical todo o espetáculo é composto como música, audível ou não, desde a dramaturgia. Ele sabe utilizar bem a música tanto em sua força de estruturação e organização, quanto em seu impacto emocional, lírico ou crítico.
No Brasil temos muitos exemplos de Teatro Musicais que, direta ou indiretamente, seguem as propostas de Meyerhold, como a Cia Balagan e o Grupo Paulada de Drama Musical (dirigido por mim). Mas também fazem Teatro Musical a Cia São Jorge, o Galpão do Folias, a Cia do Latão, a Cia do Tijolo, entre tantas outras. Embora seja também Teatro Musical as produções de Moeller e Botelho e do Miguel Falabela. O que pretendo com este post é apenas que ampliemos nossa visão sobre o tema epossamos, assim, aprofundar nossas pesquisas para desenvolvermos um trabalho consciente e autônomo.

[1] “obra de arte comum” ou, “global”, geralmente traduzidas por “obra de arte total”
[2] PICON-VALLIN, Béatrice. 2008. A Música no jogo do Ator Meyerholdiano. p. 20-21




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